Qué lá isto?!
Nesta história, várias personagens o viam como um indivíduo egocêntrico, pois era filho único. Aliás, este era o primeiro de muitos defeitos que ele tinha. Ou melhor, era razão de muitos dos defeitos do indivíduo, porque, por ser filho único, não sabia trabalhar em equipe, não sabia partilhar alegrias nem problemas, não conseguia pensar nos outros antes de si, detestava enfrentar um problema de frente e raramente dizia o que pensava verdadeiramente, e, o que era ainda pior, não tinha a mais pequena capacidade de ser auto-crítico. Quer isto dizer que, embora fosse um indivíduo com algum valor, fundamentalmente porque até sabia umas coisas largas da área em que trabalhava, ele era visto como um rapaz estranho, antipático, altivo, a roçar o arrogante. Uma besta.
Outras personagens – talvez com um conhecimento do indivíduo mais profundo, ou pelo menos de há mais tempo – viam-no como um rapaz brincalhão, bem-humorado, bom confidente, sonhador, e estranhamente sincero e directo. Era o tipo de moço com quem se pode passar umas noites cheias de alegria e diversão, em quem se pode confiar cegamente e com quem se pode partilhar histórias rocambolescas. Porém, de tempos em tempos, por ser demasiado sincero, feria essas personagens com críticas incisivas e irremediavelmente directas. É que, por vezes, ele não estava com rodeios e, sem qualquer pudor ou sensibilidade, dizia o que lhe ia na mente, ferindo os sentimentos dessas personagens que, estranhamente, o tinham, mesmo assim, em boa conta. Digamos que o viam como um bom rapaz, mas um verdadeiro “calhau com olhos”, designação repetida várias vezes por uma ex-namorada do tipo, especialmente quando discutia com ele.
A narradora desta história acha que o rapaz tem um coração do tamanho do mundo, e sabe que ele gosta muito dela. Sabe também que ele é um indivíduo que está quase sempre alegre, mas que, quando não está, acaba sempre por evidenciar um mau-humor desgraçado, típico de um depressivo crónico, que no entanto disfarça tal facto com sucesso. Ela sabe também que ele raramente toma decisões e que gosta muito de ser guiado, levado pelo amor e pela sensualidade, embora isto seja, muitas vezes, mau, pois, por ser indeciso, acaba por ser apático e, como consequência, não estimula nem impulsiona uma vida a dois. Por isso, embora, como já tenha dito, a narradora goste muito dele, e ele seja fundamental para a alegria e o bem estar desta, na realidade, recentemente, ela tem descoberto que, afinal, ele é um bocado arrogante, altivo e insensível, género “calhau com olhos”, ou mesmo uma “besta”.
O autor deste texto acha que já é tarde, pois já passa da uma da manhã e, porque amanhã é dia de labuta, devia estar a dormir, para não andar a passear as olheiras do costume pelo trabalho. Em vez de estar a escrever sobre este energúmeno egocêntrico, teimoso e insensível – acção, em si mesmo, muito egocêntrica, repara agora o autor, com um triste e vencido suspiro… – o autor decide que se vai deitar, e assim resolve fazer um ponto final
Cá está ele
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O Homem-Estupendo não compreende porque razão é que publicou este texto no seu blogue, nem conhece o indivíduo de que se fala, mas amanhã vai pedir explicações ao autor deste texto, logo pela manhã, que é para o ver com olheiras... (Toma lá que já almoçaste!)
E vai pedir-lhe também que explique porque é que a narradora gosta do tipo, se ele é considerado por algumas personagens como um “calhau com olhos” e por outras como uma besta. O Homem-Estupendo acha muito pouco credível que alguém possa gostar de um tipo assim e, já agora, considera de muito mau gosto aquela piadinha do ponto final.
Deprimente, irra!